domingo, 29 de janeiro de 2012

Enfermidade

São várias as reações das pessoas quando dizemos que temos câncer, mas a pior é aquela em que a pessoa diz: todo mundo vai morrer; eu posso atravessar a rua agora, ser atropelada e morrer... !?! Muito infeliz esse comentário, pois são indescritíveis as fases da enfermidade, desde a constatação, os mil exames, a rotina de hospital, os procedimentos invasivos e, em alguns casos, como o meu, a irreversibilidade da doença. Morrer atropelado ou de outras formas inesperadas é apenas uma hipótese... saber que se tem uma doença incurável é algo concreto, muito palpável e há que se ter uma boa estrutura psicológica.


Quem pode imaginar como é acordar todos os dias sem esperança de voltar a exercer sua profissão?

Outra reação abominável: quantas pessoas do seu círculo já morreram desde que você começou o seu tratamento? Valha-me!!! A princípio, pensamos que seria bom se o nosso avião caísse ou que tivéssemos um ataque cardíaco fulminante. Depois, vamos descobrindo felicidade nas coisas que nos restam, o brio e a dignidade falam mais alto e enfrentamos o que for heroicamente.

O pior comentário é o que diz que o câncer é uma doença cármica, que você está pagando o “mal” que fez à humanidade... que oportunidade ótima de evoluir!!!... então pegue para você! Estes estigmas que envolvem a doença são insuportáveis, sem fundamento e, mais, sinaliza que quem diz isso é uma pessoa que, no mínimo, acha-se muito mais evoluída que você.

Há pessoas que não querem nem ouvir falar sobre câncer, outras apenas ouvem e há, ainda, as que conhecem algo sobrenatural que vai nos curar. Eu, particularmente, aprecio falar sobre o que sinto, como aconteceu, como é o meu tratamento, quais as expectativas que eu ainda tenho.

Uma pessoa do meu círculo familiar, ao me ver praticamente careca, arregalou os olhos, que já não são pequenos, e, não contente, ainda disse “é, tudo passa”, com um ar de satisfação. Sim, parece que tudo passa, menos a ignorância, a maldade, a inveja... uma pena que essa pessoa, com isso, colocou no chão meio século de amizade.

Muitos me decepcionaram, como também, muitos me surpreenderam com sua capacidade de compreensão, de solidariedade, enfim, sua capacidade de amar.

Considero interessante o que disse um grande amigo: melhor saber que você está para morrer do que morrer de repente, acidentalmente, de AVC ou de ataque cardíaco, porque, pelo menos, prepara-se para a grande viagem. No mínimo, um bom argumento.



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