terça-feira, 20 de março de 2012

"Eu e eu"

“Eu e eu”
Nossa, muito esquisito o momento pelo qual passo. Jamais imaginei que teria câncer um dia, mas também, quem imagina? Por falar que não, às vezes eu perguntava às cartas e saía “A LUA”, porém eu me importava pouco.
Na realidade, eu nunca tinha nem gripe. Não me lembro da última vez que a tive, mas deve ter sido em mil novecentos e bolinha. Minhas indisposições limitavam-se a uma raspadinha de garganta, que logo passava,  quando tomava ar frio. Quando criança ficava sempre constipada, depois de adulta, nem isso. Meu nariz comportou-se muito bem nos últimos anos.
Hoje, olho-me e é difícil acreditar... por outro lado, a enfermidade revelou minha grande força interior. Jamais desanimei, sem calcular resultados, enfrentei, em primeiro lugar, o pânico; acabei com ele, derrotei-o e não tinha outro jeito. Preparei-me para todos os exames invasivos e doloridos. Ah, é quimioterapia? Que venha! É radioterapia? Que venha? Mielograma? Exame de liquor? Videocolonoscopia? Hum? Pia...pia...piaaa.... Que venha!!!!
No início, foi mais leve, não tinha dor, meus cabelos foram preservados por quase um ano, já que Mitomicina C e 5-FU não os derrubam. Cisplatina sim, então quando passei a recebê-la, não que meus cabelos tenham despencado de vez, mas começaram a ficar como uma palha e caíam bastante. Assim, no final de 2010, passei a máquina 2 nos cabelos e adorei o resultado. Não chorei o fim dos meus cabelos! Além do mais, jamais me descuidei da minha aparência. Passei a usar chapéus, diferentes tipos de turbantes, bandanas, lenços. Porém, meus cabelos despencaram mesmo foi com as dez sessões de radioterapia que fiz em fevereiro. Nunca vi igual. Só que eles caíram nos pontos onde incidiram os raios, portanto sobraram alguns cabelinhos branquinhos ainda. Não tenho nada a reclamar, aliás estou preferindo sair de careca limpa do que usar os subterfúgios.
Mas, voltando à enfermidade, no frigir dos ovos, depois de muitos dias de internação em que pensei que meu bilhete iria ser chamado, cá estou eu lutando. Não há o que pensar...não há o que pensar... só há para respirar, viver, procurar alegria em cada momento, celebrar a vida a cada minuto, amar.... uma novidade essa nova forma de amar tão profunda que merece um outro texto.
Sou sempre muito ativa: leio os jornais, meus livros preferidos, faço palavras cruzadas, sudoku, assisto filmes com a Talita, arrumo-me e saio de casa, mas nem que seja para ir até à praça, interajo com amigos no face etc.
O que muda com a enfermidade? Ah...não dá para fugir do calibramento da lente distorcida pela qual enxergava o mundo. Observo tudo, reavalio tudo e constato meus equívocos, que já passaram, e eu não sou de chorar leite derramado. Foi como foi e não seria de outra forma. Então o “eu e eu” não é, de maneira nenhuma, pesado. Digo que meu útero é uma flor, porque dele saíram flores que são o maior encanto desta fase.
Assim vou, deixando fluir....

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