Cunversa de sertanejo
Tomava uma cachaça num botequinho
rústico, luz de lamparina e chão de terra. Àquelas horas da noite, a sinistra
cidade já dormia em meio à neblina.
Papo vai, papo vem, cachaça vai,
cachaça vem, ouvi uma estória que me colocou alerta.
“Uma vez, meu pai pegou ‘um’
cascavel, enfiou dentro de um saco e dipindurô no teto da cuzinha. Tudas
tarde, quando chegava da mata, pegava de
um pedaço de pau e batia no cascavel. O cascavel, perto da hora de meu pai chegá,
já começava a si mexê agitado dentro do saco.”
Fiquei pensando, porque “o”
cascavel; mas, é claro, um réptil tão perigoso assim, tão temido, não poderia
ser “a”... questão de gênero e de ideologia; o masculino é sempre mais forte.
Semanticamente, o gênero é tão relevante ao idioma que, para as línguas que não
possuem neutro, fica complicada a classificação das coisas. Por exemplo, em
francês, o mar é “la mer”; para o português um mar feminino perde todo o
sentido natural, místico e poético.
“Mas porque seu pai batia assim
no cascavel?”
“Pra ele dexá de sê mau. Depois de
um bom tempo, meu pai soltô o cascavel, que saiu nas carrera. Apostu que aquele
nunca mais ia mordê ninguém”.
Tomei mais um gole de cachaça e
respirei fundo.
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